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News & Events 35 anos após o estabelecimento do regime de autonomia regional da Nicarágua
35 anos após o estabelecimento do regime de autonomia regional da Nicarágua
35 anos após o estabelecimento do regime de autonomia regional da Nicarágua
Cejil
Larry Salomon
Cejil

Foto: Cejil

Em um dia como hoje, 30 de outubro de 1987, a Lei 28 (Estatuto das Regiões Autônomas da Costa Atlântica-Caribenha) foi publicada no jornal oficial da Nicarágua. Certamente, este regime de autonomia regional foi icônico e marcou um marco histórico de relevância internacional na América Latina, pois foi pioneiro na época. Mas é importante abrir as páginas da história para lembrar como esta lei surgiu, ou seja, o seu contexto.  Ter uma lei e uma constituição política que reconheça plenamente os direitos dos povos indígenas da Nicarágua não é simplesmente a vontade do Estado republicano moderno; lembremos que nossa região tem sido atormentada por muitos episódios de historicidade jurídica, política e econômica. A história mais recente, pelo menos desde 1860, mostra o famoso "Tratado da Nicarágua" no qual a Grã-Bretanha e a Nicarágua reconheceram a autonomia dos povos da Muskitia, embora sem o consentimento dessas populações. Da mesma forma acontece com o Tratado Crapton-Webster (1852) no qual os Estados Unidos e a Inglaterra reconheceram a autonomia dos povos da Muskitia, mas este tratado foi denunciado pela Nicarágua como uma agressão contra a soberania do país. Isto foi seguido pela incorporação forçada da reserva da Muskitia em 1894 e sua consumação com o Tratado Harrison-Altamirano, que revogou o Tratado de Manágua de 1860.  Estes três tratados constituem os fundamentos originais da autonomia na atualidade. 

Na década de 60, o movimento indígena da Muskitia (ALCARIC e ALPROMISU) ressurgiu e mais tarde, após a revolução sandinista, abriu outros horizontes de diálogo, porém, esse esforço levou a guerras agitadas e sangrentas nos anos 80, que após enfrentamentos intensos e devastadores, aproximadamente em 1984, foi restabelecido o diálogo entre o governo da revolução sandinista e os líderes indígenas de diferentes facções (MISURASATA, MISURA, SUKAWALA, Kisang pela paz, MISATAN entre outros), alguns com maior resistência e contribuições do que outros, concluindo em um projeto de lei de autonomia que finalmente, em 2 de setembro de 1987, aprovou a lei que estabeleceu o regime de autonomia regional, icônica e pioneira na América Latina naqueles anos. 

Após 35 anos de existência desta lei, ainda há disposições legais que não foram exercidas, como o poder de criar um plano de arbitragem regional, a elaboração de um projeto de lei sobre recursos naturais, o estabelecimento de mercados de comercialização entre comunidades caribenhas (CARICOM) entre outras questões, enquanto vários setores acadêmicos da costa caribenha, líderes e outros movimentos exigem reformas profundas e estruturais nas quais os conselhos regionais adquirem poderes ou que o Estado transfira poderes substanciais, como poderes legislativos, regulatórios, executivos e judiciais, e descentralização financeira.  

Vale a pena reconhecer que, nestes 35 anos de vida, houve avanços importantes diretamente ligados à gestão autônoma; duas universidades comunitárias interculturais (BICU e URACCAN), um Subsistema Regional de Educação (SEAR), o Modelo Regional de Saúde Intercultural do Atlântico Norte (MASIRAN), o estabelecimento de governos territoriais indígenas e afrodescendentes no âmbito da Lei 445, a demarcação e titulação de terras comunitárias, embora ainda haja uma enorme tarefa, que é a implementação da etapa de regulamentação territorial envolvendo a governança da propriedade comunitária, que hoje constitui o maior rigor e exigência da grande maioria dos 23 territórios indígenas da costa caribenha da Nicarágua. 

A razão da autonomia é o território ancestral, a língua e a identidade cultural, e estes devem, portanto, ser a prioridade dos diversos órgãos administrativos ou de governo das regiões autônomas. 

Viva a autonomia, que possamos trabalhar por nossa autonomia, nossos líderes fizeram o que puderam! Hoje a nova geração tem a grande responsabilidade de continuar construindo e torná-la sempre um assunto vivo!

 

Por. Professor Larry - Asangpas Salomon P. 

Jurista indígena, pertencente ao povo Mayangna da Nicarágua. 

Nicarágua, 30 de outubro de 2022. 

 

Tradução: Amanda Martínez

 

Acrônimos utilizados

 

ALCARIC - Associação de Agricultores Miskitos

ALPROMISU - Aliança para o progresso dos povos Miskito e Sumo

BICU - Bluefields Indian & Caribbean University

URACCAN - Universidade das Regiões Autônomas da Costa Caribenha Nicaraguense

MASIRAN - Modelo de Cuidados de Saúde Interculturais para a Região Autônoma da Costa Norte do Caribe

MISATAN - Assembléia Avaliadora da Organização Miskito na Nicarágua

MISURASATA - Miskitos, Sumos, Ramas, Sandinistas Aslatakanta "Unidos" 

MISURA - Miskito, Sumo, Rama

SEAR - Sistema Educativo Autônomo Regional

SUKAWALA - Sumu Kalpapakna Wahaini Lani, em português " Organização Nacional das Comunidades Indígenas Mayangna da Nicarágua